quarta-feira, 27 de maio de 2020

Resenha: O Livro das Coisas que Nunca Aconteceram


Minha história com O Livro das Coisas que Nunca Aconteceram começou em 2018, na 25ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, quando me deparei com seu título inusitado na pilha dos livros que custavam R$10. Na época, eu trabalhava como Jovem Aprendiz recebendo um salário ínfimo de modo que qualquer obra literária que custasse um valor simbólico interessava-me muito mais se comparada as com valores mais altos.

Infelizmente, depois de adquiri-lo, cometi o erro de abandoná-lo na minha estante e dar pouquíssima atenção a ele. Até que mais recentemente, em meio a dúvida sobre qual livro começaria a ler, me deparei com ele e, mais uma vez, me senti instigada por seu título que desencadeou uma curiosidade repentina e avassaladora em mim.

Foi então que decidi seguir nessa empreitada e ler O Livro das Coisas que Nunca Aconteceram, um romance LGBT escrito pela autora brasileira Ana Luiza Savioli e publicado pela Hoo Editora em 2016.

A trama começa com Harry Darwin, um bolsista de polo aquático no colégio St. Raphael, sendo resgatado no Lago dos Padres por um completo desconhecido. Quando acorda em sua cama, na manhã seguinte, ele não se lembra de nada. O que estava fazendo no lago? Quem o resgatou? Como veio parar em seu quarto? Todas essas dúvidas enchem a cabeça do garoto.

Naquele mesmo dia, o colégio recebe a notícia de que Damon Knight, um aluno que há dois anos desapareceu sem deixar vestígios, foi encontrado morto próximo ao lago. No velório, Harry têm um lapso de memória ao se deparar com o corpo do jovem e descobre que foi ele quem o salvou no lago, na tarde do dia anterior, deixando-o ainda mais confuso.

Quando Matthew Knight chega à escola ocupando o quarto que era de seu irmão, Harry busca maneiras de aproximar-se do garoto a fim de entender os motivos que levaram Damon a salvá-lo e, em seguida, suicidar-se. Entretanto, descobre que os mistérios que rodeiam os Knight são muito mais profundos do que imaginava.

Ao mesmo tempo que Darwin começa a compreender certos acontecimentos estranhos que se desenrolam na escola, novas incógnitas surgem e Matthew não parece disposto a ajuda-lo a resolvê-las.

Apesar de possuir passagens confusas devido complexidades temporais, a autora explora destes artifícios com magnificência e desenvolve um enredo sólido que permite a imersão do leitor e facilita a identificação com os personagens. Tudo isso faz com que o livro se torne mais fascinante a cada capítulo ao ponto de ser impossível largá-lo.

O Livro das Coisas que Nunca Aconteceram é uma obra sobre o tempo, sobre amores e amizades e, também, sobre sacrifícios. Seu final é surpreendente e dá sentido à história como um todo. Não se assuste se, nos capítulos finais, sentir-se o gif mind blown em pessoa, pois foi exatamente dessa forma que me senti.


Escrita por Gabrielle Colturato



Gif Mind Blown by Giphy


quinta-feira, 14 de maio de 2020

Resenha: A Realidade de Madhu


Encontrar livros nacionais que chamem a atenção não é uma tarefa fácil para muitos leitores, principalmente se pretende fugir dos clássicos literários obrigatórios para vestibulares. Se você busca um livro diferenciado e fora da caixinha, A Realidade de Madhu é a obra certa.

Escrito pela autora brasileira Melissa Tobias e publicado no ano de 2014 pela Editora Novo Século, o romance de ficção científica foi reimpresso após se popularizar nas redes sociais seis anos depois de seu lançamento. A menção de uma pandemia viral, no ano de 2020, responsável pela morte de bilhões de terráqueos causou espanto e tumulto entre os internautas por conta da pandemia causada pelo novo coronavírus que, desde janeiro, já totalizou mais de 280 mil mortes.

A história reúne referências de diversas esferas do conhecimento e traz à tona princípios cristãos, budistas e hindus mesclados a características da cultura indiana e a aspectos holísticos que resultam em uma mistura um tanto quanto peculiar. Além disso, para aqueles que são fãs, é possível reparar uma sútil alusão a franquia estadunidense Star Wars. (Ou será que estou louca?)

O enredo se desenrola sob a perspectiva da jovem Madhu, uma garota de 19 anos, estudante de Arquitetura na Universidade Bela Artes, que mora com sua família em uma chácara na cidade paulistana de São Roque. Um dia, ela acorda a bordo da nave intergaláctica Shandi33 sem se lembrar de quase nada antes de sua abdução.

Confusa, Madhu se vê desamparada em meio a androides e híbridos que menosprezam sua origem terráquea. E como se estar longe de casa já não fosse o suficiente, ela é incumbida de “salvar a raça humana terráquea da grande destruição planetária”.

Madhu é uma Semente Estelar e está destinada a uma missão que transformará toda a Via Láctea. Só ela é capaz de despertar a Kundalini da Terra e semear a Terceira Realidade. Só Madhu conseguirá expandir essa Nova Realidade para todos os multiversos.

A Realidade de Madhu traz em sua trama uma proposta interessantíssima: um novo Universo consolidado por meio do amor. Entretanto, apesar de ser um romance de fácil leitura, existem brechas no livro que confundem o leitor e o fazem retornar algumas páginas como garantia de que nada foi esquecido.

A autora combinou elementos dispares com muita maestria, ao ponto de estes se complementarem, mas pecou no desenvolvimento das inúmeras ideias que teve para sua personagem. É notória a tentativa de reunir muitos acontecimentos marcantes em trechos curtos. No decorrer da leitura é possível perceber que o enredo se estende demasiadamente em cenas que não contribuem para a construção da história e acelera em momentos que, se bem elaborados, causariam maior impacto no leitor.

Além disso, nota-se o emprego exacerbado de adjetivos que parecem ser utilizados para compensar a falta de desenvolvimento dos acontecimentos ou suprir lacunas que sequer existem. A autora busca detalhar objetos, personagens e ambientes, mas não consegue descrevê-los sem qualificá-los.

Embora haja entraves narrativos no decorrer do livro, sua contribuição para a literatura e para a ficção científica brasileira é inegável!


Escrita por Gabrielle Colturato

terça-feira, 5 de maio de 2020

Resenha: Mulheres Sem Nome



Mulheres Sem Nome é o romance de estreia da escritora estadunidense Martha Hall Kelly. Publicado originalmente em abril de 2016 pela editora nova-iorquina Ballantine Books e em Novembro de 2017, no Brasil, pela Editora Intrínseca, Mulheres Sem Nome foi indicado ao prêmio Goodreads Choice Awards por Melhor Ficção Histórica em seu ano de estreia.

A história de Mulheres Sem Nome é contada a partir da perspectiva de três mulheres distintas que moram, cada qual, em um lugar do mundo.

Caroline Ferriday é uma socialite nova-iorquina e ex-atriz da Broadway que se dedica fervorosamente ao seu trabalho voluntário no Consulado Francês recepcionando estrangeiros recém-chegados aos Estados Unidos. Além disso, ela destina seu tempo livre promovendo eventos de caridade que a possibilitam angariar fundos para enviar cestas básicas a diversos órfãos na França. 

Kasia Kuzmerick, por sua vez, é uma adolescente polonesa de descendência alemã que vive com seus pais e sua irmã Zuzanna na cidade de Lublin, localizada no leste da Polônia. Com a invasão de Hitler a Polônia, em 1939, Kasia vê sua vida e a de sua família virar aos avessos quando soldados da SS batem à sua porta à procura de seu pai, responsável pela agência central de correios da cidade. Tomada por um latente inconformismo, ela torna-se mensageira da resistência na esperança de ser útil ao país em meio à guerra. Entretanto, as consequências desta decisão são irreversíveis.

Herta Oberheuser é uma alemã recém-formada em medicina que vê seu sonho de se tornar cirurgiã ir por água abaixo em meio a uma Alemanha nazista em que mulheres devem prover e criar seus filhos arianos. Guiada por seus propósitos, Herta aceita uma vaga do governo e torna-se médica no campo de reeducação para mulheres de Ravensbrück, situado no município de Fürstenberg.

Nenhuma destas mulheres imaginavam que a Segunda Grande Guerra que implodia e se alastrava pela Europa mudaria, por completo, suas vidas. Por meio da narração destas três mulheres, Martha Hall Kelly guia o leitor por uma história envolvente e arrebatadora que o surpreende do início ao fim.

Dividido em capítulos instigantes que incentivam a continuidade da leitura, Mulheres Sem Nome é um livro bem construído que surgiu a partir de pesquisas profundas sobre fatos reais que assolaram a humanidade. Um livro de ficção histórica que comove e nos faz repensar as atrocidades causadas pelos seres humanos no decorrer da história do mundo.


Escrita por Gabrielle Colturato